Millennium BCP

O Que Podem Esperar Os Bancos No Futuro?

Millennium BCP

Este artigo não versa os rumores em torno do Millennium BCP, mas sim as tácitas implicações da falta de reconhecimento e compreensão do sucedido nas últimas semanas. O rumor alegadamente iniciado por email, posteriormente propagado por SMS e finalmente via redes sociais bem como outras ferramentas de social media, acabou por ser tratado de forma amadora.

Pela voz de Santos Ferreira, o Millennium BCP afirmou-se “surpreendido com o impacto e grau de organização” do esforço concertado para enfraquecer a já debilitada confiança do público geral no sistema financeiro. O facto dos rumores terem atingido o pico a uma sexta-feira, quando ninguém na instituição estaria preparado para lidar com a crise, acaba por parecer quase mundano.

Posteriormente, e juntando-se ao debate, designadamente a secção editorial do Público, ofereceram-se conselhos higienizados, reclamando que “os rumores combatem-se com factos”. Alguns, tais como o Professor Marcelo Rebelo de Sousa, acudiram a explicar a solidez do banco em questão enquanto que outros gostariam de pensar que “os clientes ignoram os rumores sobre problemas financeiros do BCP”. Pessoalmente tive conhecimento de alguns que reagiram de forma insciente. A ignorância poderá afigurar-se um termo algo desmesurado se tivermos em conta que nós, humanos, e contrariamente ao senso comum, somos na realidade extremamente irracionais – teria você apostado em ignorar “conselhos” de outros amigos “racionais e inteligentes”? Especialmente numa altura em que estudos patenteiam que a confiança na palavra de colegas, amigos e familiares se sobrepõe a todas as outras?

Malcolm Gladwell, no seu livro The Tipping Point – How Little Things Can Make a Big Difference, descreve o poder dos influenciadores, conectores e mavens. O facto surpreendente reside na lei dos poucos, evocando a escassez de agentes necessários que propagarão, ou não, algo de forma eficiente numa escala não quantificável, todavia mais preocupante porque imprevisível. Estes agentes, denominados hubs (pontos centrais) da rede, não necessitam nem procuram a utilização dos mass media (media tradicional). Juntando-se estes últimos à charada, a essência da notícia deixa de ser a mensagem mas sim a sua consequência.

Em Setembro de 2007, clientes do banco Northern Rock dirigiram-se em massa às suas sucursais, levantado tudo das suas contas bancárias até ao último cêntimo. O que nos leva a pensar que o mesmo seria impensável em Portugal? Provavelmente, a negação, o receio de ter que enfrentar a realidade cruel que para os bancos já não resta outra alternativa que não prepararem-se para esse dia e de que social media é de facto a única oportunidade que detêm em certificarem-se que tal não sucederá num futuro próximo.

Os hoaxers (responsáveis pela confusão instaurada) poderão não ter alcançado o seu derradeiro objectivo, mas acabaram por conquistar o mais difícil – assegurarem-se que a mensagem se difundiu em proporções alarmantes, bem sob o radar, até que já fosse demasiado tarde para inverter o processo. Um futuro ataque será certamente mais eficaz, mediante a construção obtida pela sua experiência mais recente. Qual vírus que se metamorfoseia consoante a utilização de antídotos, os hoaxers inteirar-se-ão de que, de facto, a lacuna residiu no conteúdo das mensagens – o ingrediente que faltou para atingir o ponto de viragem – the tipping point.

De modo algo perverso, estes hoaxers tornar-se-ão, eventualmente, numa espécie de profeta da nova era – através das suas afirmações, caso se atinja o ponto de viragem e o pânico se instaure massivamente, conduzindo a um levantamento de fundos colectivo. Será que acabarão por causar ou prever o fim da instituição financeira? Se acredita que a fragilidade advém da incapacidade da indústria em compreender e gerir os desafios do poder da Internet, bem como, as ferramentas que surgem cada vez mais para simplificar e aumentar a partilha de conteúdo (não confundir com factos), então a vitima deverá, igualmente, partilhar uma quota parte da culpa.

Em Abril de 2010, Facebook lançou uma colecção de social plug-ins que permitem a qualquer utilizador colocar comentários do Facebook bem como o botão Like em qualquer página da web fora do Facebook. Em apenas três semanas, após o lançamento destas ferramentas, mais de 100,000 páginas já as utilizavam para facilitar a partilha de conteúdo.

Tornou-se, indubitavelmente, o maior e mais importante passo, conferir o dom da ubiquidade a própria existência de redes sociais, através da criação de ferramentas, quer de caris social, quer com o intuito de serem colocadas onde o utilizador se encontra, eliminando a necessidade de deslocação até ao destino para divulgar a mensagem.

Estes social plug-ins do Facebook tornarão o impulso de agir mais fácil e mais natural, inquestionavelmente, mais que qualquer outro desenvolvimento desde da invenção do Facebook que excede agora os 500 milhões de membros.

Paralelamente, o Twitter cinge o pensamento, baliza a opinião ou “facto” a 140 caracteres, forçando o utilizador a abreviar toda e qualquer frase a uma mera exclamação, prefigurando-se o resultado, quase sempre, numa partilha imediata, emotiva, egocêntrica, frequentemente desprovida de sentido – a partilha pela mera razão de razão partilhar.

A veracidade e a consequência são relegadas para segundo plano no calor do momento, afigurando-se este como apenas outro exemplo da nossa irracionalidade, sendo que muitos de nós fazem-no diariamente: quer no reenvio de anedotas disparatadas para uma listagem de contactos, independentemente de abrangerem emails de empresa, quer no reenvio de emails de aviso que jogam com a nossa consciência, a decisão árdua de enviar ou não um aviso gratuito aos amigos, colegas e/ou família, torna-se demasiadamente obvia para ignorar.

Não é legítimo solicitar confiança sem a conquistar. Na verdade, poucos revelam interesse em propagar rumores, mais que não seja, pelo simples facto de que os jornais nacionais tornaram-se um género de 112 – onde estava o Millennium BCP? Em reunião com os advogados, administração e departamento de comunicações e marketing? O cúmulo de enviar um email aos funcionários pedindo profissionalismo e apoio na divulgação da verdade torna-se ainda mais enigmático. É algo que, uma vez mais, se conquista, mas não se pede.

Camuflarmo-nos por detrás do obstáculo que constitui o anonimato na Internet e, neste caso, cartões de telemóvel pré-pagos, crê-se tão prejudicial ou insípido quanto a criação de mais legislação e software para digladiar a invicta batalha contra a pirataria. Esta estratégia quase aniquilou a industria discográfica e poderá, contingentemente, tornar-se factor capital na alteração da industria bancária pelo menos, tal como a conhecemos hoje.

Sobreviverão apenas aqueles que abraçaram já este novo paradigma e acometem de volta, não através de press releases e publicação de “factos”; subsistirão apenas os que conseguem fomentar benevolência, internamente, envolvendo todos quantos acabam por dar a cara pelas instituições e lutam diariamente na linha da frente, dotando-os duma voz imparcial e sem controlo, enquanto que, simultaneamente, estabelecem empatia externamente com os seus clientes, utilizando as mesmas ferramentas e canais para ouvir, conversar, agir, colocando assim o cliente onde deverá encontrar-se sempre – à frente de tudo e de todos. Consciencializemo-nos que não existe qualquer outra alternativa – abraçar social media ou arriscar ser engolido, uma vez mais, pelo mesmo ser que se tenta controlar.

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